Vive em Santos, Lisboa, um bairro já por si inspirador. A casa é alugada, o que invalidou obras de fundo, mas a base é boa e a sua configuração garante a desejada luz natural. O resto, é o resultado de um acumular de objetos de várias proveniências, o somatório de uma vida cheia.
Fotografia: Gui Morelli / Texto: Isabel Figueiredo / Produção: Amparo Santa-Clara
Remodelada pelo proprietário, que manteve a traça original, a casa tem uma disposição atípica, considerando o bairro e a época. “Funciona em largura e não em profundidade, o que lhe dá muita luz”, comenta o seu habitante, para quem os interiores são, assim, como “um laboratório constante”. E explica: “Por ser alugada, as intervenções permitidas foram sempre pouco estruturais, mas tive a sorte de a casa ter bons ‘ossos’, sobre os quais qualquer acrescento significou uma melhoria”.
O que aqui vemos é, como refere, resultado do acumular de objetos de várias proveniências, de leilões, das muitas viagens feitas, da visita a lojas de antiquários, de design, a galerias, mas também fruto de algumas heranças… “e uma mão-cheia de presentes e trocas entre amigos”. Para o nosso interlocutor, “uma casa é isso mesmo, um ser vivo que é o espelho da nossa vida. Portanto, o estilo de vida será como a casa, uma salada de frutas que, espero, faça algum sentido”.
As quatro assoalhadas somam cerca de 85m2 e a sua configuração potencia a entrada de luz natural. Tem três frentes, a nascente, sul e poente/norte, e esta disposição permite observar, ao longo dos vários espaços, a evolução da luz durante o decorrer do dia, “o que me fascina”, comenta. E prossegue: “Às vezes tenho a sensação de estar na rua sem ter de sair de casa”. Mas há outros encantos, como o som ritmado do sino da igreja. “A alguns dos meus convidados o som do sino parece assustar, mas a mim dá-me consolo e pauta o meu dia – a verdade é que já me tirou da cama a tempo de uma reunião!”.
Pode ser que um dia a casa lhe pertença, e se for essa a sua decisão, será para ele um enorme prazer escolher novos materiais… “para a cozinha, para os rodapés”. “Estudei três anos de arquitetura e a isso somo a minha paixão pelos interiores… ideias não me faltam! Aliás, já pensei adotar essas valências e fazer disso profissão, quem sabe um dia”, diz-nos.
Todas as estantes e a mesa de centro da sala foram desenhadas por si. “Foi a primeira vez que me atrevi a fazê-lo e na próxima casa não vou querer parar. De resto, como referi, é um bocado uma história que continua. Há peças que comprei ao Manuel Reis, na loja da Atalaia, peças adquiridas em feiras e mercados pelo mundo fora, muitos quadros comprados a amigos, coisas encontradas na rua…”. Gosta da adrenalina da caça: “Por pertencer ao universo das artes, sempre me pareceu demasiado simplista chegar a uma loja e comprar algo em exposição”. E dá como exemplo o lustre de vidro de Murano adquirido num leilão on-line, “muito barato”. A mãe sempre lhe disse, conta-nos, que o barato sai caro, e assim foi. “Chegou com duas peças partidas que agora estão a ser copiadas em Itália para substituir. Mas o divertido é sempre o processo…”.
Há quadros, imagens sagradas, tapetes, lustres, veludos; há tapetes, mesas de apoio, cerâmicas, livros e roupa pendurada, há um sem-fim de peças, cores, padrões e texturas. Há vida e memórias, experiências e desenvoltura na forma como tudo aqui dialoga.