Uma casa, três mulheres e um projeto de interiores em linha com a base arquitetónica original, onde tudo bate certo e a vida flui com muito estilo.
Fotografia: Gui Morelli / Produção: Amparo Santa-Clara / Texto: Isabel Figueiredo
“Não tenho a certeza se fui eu que escolhi este apartamento ou se foi ele que me escolheu a mim”, começa por nos contar Sandra Nascimento, a fundadora da SAL Concept Store e “mulher dos sete-ofícios”, como faz questão de acrescentar, com um sorriso aberto.
Por se identificar tanto com a estética da época, “e pela forma como se sente este espaço habitacional vanguardista, integrado numa simetria entre a função e a arte”, a decisão em relação à sua nova morada foi fácil e emocional, o que nem sempre é uma boa aliança, pelas razões óbvias. Mas, neste caso, tal não se verificou. Assunto arrumado. Faltava, contudo, que o apartamento, localizado nas Torres de Alfragide, refletisse o estilo de vida e o próprio estilo de Sandra.
“Não mudei nada na estrutura do apartamento, porque ele ainda mantém em muito bom estado os equipamentos e os materiais originais”, dando, como exemplo, “a lindíssima porta em fole feita totalmente em madeira, as portadas da varanda e o toucador do quarto, integrado na parede junto ao roupeiro”, tal como todas as aplicações nas janelas, rodapés e ombreiras em sólida madeira de mutene e o mármore de Lioz nas casas de banho e cozinha. “Esta é, para mim, a conjugação perfeita de materiais”, confessa.
O T1+1 é pequeno, mas tem dimensões generosas e estas, acrescenta, são “mais do que suficientes para as nossas necessidades, as da família e as da nossa adorável e grande companheira LUA” — a cadela de olhar meigo que acompanha as três mulheres há vários anos.
Localizado nas Torres de Alfragide, o edifício residencial, cuja obra foi concluída em 1974, nasce de um projeto do Atelier Conceição Silva que integrou, além da vertente de projeto e obra, as de design, equipamento, paisagismo, escultura e pintura, representando um estilo pioneiro de abordagem interdisciplinar e de pormenor. Os materiais proeminentes são o betão, a madeira maciça (mutene) presente também no interior dos apartamentos, o reboco branco, o vidro e o metal pintado de amarelo.
Os halls e as entradas com sinalética e motivos coloridos desenhados sobre o betão, da autoria de Sá Nogueira, desalinhamentos entre espaços e uma linguagem de continuidade e de descontinuidade, de cheio e de vazio, que evidenciam uma unidade entre o exterior, os espaços comuns, são, no seu conjunto, características que acentuam a sua importância patrimonial.
“Quando decidimos aqui morar, tivemos de nos despojar e trazer apenas aquilo que, para nós, valia a pena”, prossegue. “Que grande lição, pois mais de metade das coisas que temos são supérfluas, não precisamos delas para nada. Assumi esta casa vazia, como mais um projeto da SAL. Reutilizei algumas peças do apartamento anterior e desenhei e mandei executar outras, sob medida, como o sofá, as camas e as cabeceiras. Pintei as portas e as paredes de cores e coloquei as pinturas e fotografias preferidas nos lugares certos”. Sandra destaca, a esse propósito, uma fotografia do mar em grande formato da filha Mariana, de que gosta especialmente e que foi colocada no seu quarto, “como se fosse uma janela virada ao mar”.
Contas feitas à decisão, o saldo é tão positivo quanto o desejado. Perto de tudo, mas nem por isso no centro da agitação da grande urbe. Ancorada num estilo arquitetónico que tanto a cativou e tanto lhe diz, a casa é generosa na forma como foi lido o seu interior, as preexistências e a história, porque ali tudo encaixa com muito estilo e bom senso. O estilo desta família e o estilo do projeto de Sandra — SAL —, um reflexo da sua coragem, criatividade e sentido de oportunidade.