Nem sempre a palavra “casa” evoca tantos sentimentos e nos impele a tantos elogiosos cumprimentos como esta. Desde o primeiro contacto, somos brindados com a redescoberta do prazer que significa entrar numa casa assim. Um refúgio muito pessoal, onde se guardam tantas memórias e experiências, preferências e desejos.
Fotografia: José Manuel Ferrão / Produção: Amparo Santa-Clara / Texto: Isabel Figueiredo
Numa rua onde o trânsito é escasso, onde nem todos passam a caminho da praia, este apartamento, no Estoril, encerra um mundo de vivências, a da sua proprietária e a dos que com ela privaram e ainda privam. A sua varanda coberta por vegetação, que forma um toldo natural, é um dos muitos predicados, reforçado pela proximidade com o mar, e a sua vista, bem como pela tranquilidade que evoca.
Mas nem sempre a casa foi assim. Depois de adquirida, em 2017, houve que adaptá-las aos gostos e estilo de vida de quem ali habita, procedendo-se a um trabalho de recuperação e de remodelação, nomeadamente de chão e janelas, entre outros elementos, dotando-a de mais conforto e de uma atmosfera que refletisse exatamente a alma dos seus moradores e as muitas memórias que a ocupariam doravante.
O estilo clássico e requintado, mas com um quê de ‘boho’, rico em texturas, cores e peças de várias proveniências, é o espelho da sua proprietária. Peças herdadas, outras adquiridas para esta morada, quadros de pintores portugueses onde se contam um Menez, herdado da tia, um Gil Heitor Cortesão, um José Loureiro, espelhos… há aqui em absoluto a mão de uma mulher especial, com uma vivência rica. “Trabalhei com o Pedro Espírito Santos, no Brasil, onde vivi”, revela-nos. “Posso dizer que tive um grande mestre e algumas peças que tenho em casa são suas”, prossegue. “Além disso, adoro renovar, visitar lojas de velharias, ir a leilões. Como tal, todas as peças nesta casa contam uma história, de família ou de amigos”.
Nos cerca de 200m2 de área, estas referências e memórias vão despertando a nossa atenção, enquanto circulamos pela casa, cuja tipologia compreende, além da cozinha apoiada por uma outra varanda onde se guarda o orquidário, virada a norte, e zona de serviço, a sala de estar e a casa de jantar, o quarto de dormir e uma salinha de televisão, que, quando necessário, faz as vezes de quarto de hóspedes, bem como um atelier, atrás da casa de jantar. Todas as fachadas têm janelas, um privilégio e uma forma de iluminação natural bem-vinda e, a partir da sala, acede-se à varanda com vegetação frondosa, da qual se avista o mar, um lugar especial para aí se servirem refeições leves ou, tão-só, estar.
A circulação nesta casa faz-se de forma intercomunicante entre as várias divisões, por meio de portas ou paredes vazadas, o que lhe atribui ainda maior riqueza, porque de uma divisão vislumbramos a beleza da adjacente.
Na cozinha mora um lustre, que aqui brilha, a solo, em contraste com a beleza dos azulejos escolhidos à medida, em substituição dos originais; os armários foram pensados de modo a que não ocultassem estes mesmos azulejos, e por isso ficaram limitados a uma altura reduzida. Para arrumações e exposições foi dada preferência às prateleiras. Da mesma forma, e em linha com o gosto pela vegetação, nomeadamente palmeiras e pássaros, nesta casa moram, aqui e ali, peças que nos relembram esta simpatia pelo mundo natural – caso da coleção de gravuras de palmeiras no quarto e no corredor, do candeeiro com pássaros que pende sob a mesa de jantar, de um outro na casa de banho…
No atelier, modificam-se vestidos das amigas e dá-se aso à imaginação. É, também este um espaço especial, um refúgio para onde escapa sempre que a imaginação, ou a vontade, a impelem a tal. E também aqui a janela deixa entrar a luz e o verde do exterior.
A atmosfera é rica e abundante, na sua mais abstrata leitura. Não se trata aqui do valor das peças, mas antes do valor mais precioso, daquele que encerram, afetiva e visualmente. A vida, aqui, é bela.