A poucos metros do boulevard de Lisboa, que é como quem diz – Avenida da Liberdade –encontramos prédios cujas histórias se misturam com as do país. Se falassem, estas fachadas contariam como eram sedutoras as noites do Parque Mayer nos seus tempos áureos, ou agitadas as manhãs em dias de Feira da Alegria (precursora da Feira da Ladra).
Fotografia: Revista Urbana I Texto: Mafalda Galamas
A zona nobre da cidade exige, sempre que possível, remodelações à altura. E foi aqui, a poucos passos de distância, que a decoradora Rita Roquette nos mostrou mais um projeto de sua autoria. Por dentro, o prédio do século XX reflete os dias de hoje. O imóvel já conheceu duas obras de melhoramento e, se a arquitetura de interiores ficou aos comandos do proprietário, toda a parte decorativa exigiu um outro olhar.
As linhas contemporâneas, materiais de revestimento ou as peças de design contam a história de um casal de criativos, que encontrou neste duplex T3 o seu refúgio citadino. A casa distribui-se por 140 m2, zonas de convívio em baixo, e áreas privadas, como os quartos, em cima.
Mas é na sala onde (quase) tudo acontece. As reuniões de família, os momentos de lazer (com muita música ou leitura) e o convívio entre amigos. As linhas direitas são uma constante pela casa. Os armários desenhados à medida junto às janelas, ou a lareira embutida, denunciam que nada deve ser deixado ao acaso.
Bem delimitada, a zona de estar é, acima de tudo, confortável. Os sofás, cadeirões ou banqueta de centro, em pele de vaca, foram adquiridos na loja Rita Roquette Interiores. Os materiais naturais foram uma escolha óbvia para a decoradora, muito na base dos linhos e algodões. Conjugam com peças familiares que os proprietários fizeram questão de manter, como os candeeiros prateados dos anos 60 nas mesinhas de apoio.
As cadeiras da sala de jantar foram outros desses casos. «Os proprietários quiseram uma mesa oval que comportasse 14 pessoas sentadas, pois a rentabilidade é maior do que se fosse retangular ou redonda, e como eles recebem imenso», diz Rita Roquette. É feita de uma madeira exótica e combina na perfeição com as cadeiras de design intencionalmente restauradas pelo proprietário. Haviam sido adquiridas na Paularte, em Braga, e tinham na sua origem uma velatura em vangue. Também o estofo foi alterado para um veludo verde e fez o contraste perfeito. Faziam par com a mesa, que hoje serve de consola, também ela restaurada para a sua nova função. Por sua vez, os candeeiros redondos, que iluminam as refeições de família, vieram de um antiquário: «Considerei que o bronze ajudaria a atenuar e equilibrar o ar mais “bruto” da mesa, conferindo inclusive um certo requinte», acrescenta a decoradora.
É difícil definir um estilo para este ambiente. O resultado é eclético e diversificado. Reúne peças mais rústicas, com outras clássicas, conservadoras e até de inspiração nipónica – como o pequeno móvel na zona de refeições, que acompanha a janela da ponta. Faz frente com o incrível biombo de vidro, intencionalmente criado para dar luz e fazer a ligação com as escadas do hall. É aqui que estão reunidas algumas das peças mais inusitadas, uma mala de viagem para guardar bebidas, ou a enorme tartaruga da Vista Alegre, acompanhadas por outras peças trazidas de viagens… Sem dúvida, elementos incontornáveis desta sala.
Um olhar de relance pelos mosaicos de estilo tradicional, lá ao fundo, denunciam a cozinha. Foi inteiramente remodelada. As linhas direitas dos armários casam com alguns toques de tradição, como os pequenos losangos azuis-claros do mosaico hidráulico. Também a iluminação LED e os gadgets da bancada contrastam com detalhes de outros tempos… A balança adquirida numa feira de rua é um desses exemplos. Moderna e funcional a divisão está, sobretudo, pensada para facilitar a exigência das rotinas.
Quase todo o pavimento em pedra mármore foi agora substituído por madeira, tão mais acolhedora, sobretudo nas zonas dos quartos. Parte da área destinada aos quartos dos três filhos do casal fora reservada a uma nova casa de banho. Esta, profundamente moderna, foi erguida em pedra mármore carrara e vidro, com armários embutidos, que preenchem mais eficazmente as atuais necessidades da família.
Ao lado, os quartos dos jovens, ainda estudantes, refletem a passagem do tempo, deixando para trás o manancial de brinquedos. Agora, são, sobretudo, espaços funcionais onde eles podem dormir, receber amigos e estudar. Os tetos “desenhados” não foram impedimento para um resultado bem conseguido, uma vez que o facto de serem esconsos num dos lados não limitam os quartos em qualquer das suas funções. Ambos têm acesso à única parte exterior do apartamento, uma privilegiada varanda tão única e valorizada em espaços citadinos.
Resta-nos a suíte… Deixada para o fim talvez propositadamente, numa espécie de fecho de ciclo calmo e sereno. Aqui, o mobiliário foi intencionalmente desenhado, bem como o recanto do closet, organizado e utilitário. À semelhança do piso inferior, a escolha dos têxteis por parte de Rita Roquette voltou a recair para os materiais naturais, tão convidativos ao conforto e relaxe.